A beleza da amizade



Amigo autêntico educa pela palavra e pelo exemplo

No conturbado mundo de hoje a ausência da verdadeira amizade é uma das causas de inúmeros males. É este laço sagrado que une os corações. Quirógrafo das almas nobres, é a afeição que fundamenta o lídimo amor, sendo este a própria amizade em maior intensidade.

Desde a mais remota Antiguidade o homem se interrogou sobre a essência da amizade. Filosofou sobre este aspecto da interação humana. Podemos dizer que a amizade é uma certa comunidade ou participação solidária de várias pessoas em atitudes, valores ou bens determinados. É uma disposição ativa e empenhadora da pessoa.

O valor da amizade foi revelado pela Bíblia: "O amigo fiel não tem preço" (Sl 6,15), pois "ele ama em todo o tempo" (Pv 17,17. "O amigo fiel é uma forte proteção; quem o encontrou, deparou um tesouro" (Eclo 6,14). "O amigo fiel é um bálsamo de vida e de imortalidade, e os que temem o Senhor acharão um tal amigo" (Eclo 6,16).

A função psicossocial da amizade é, assim, de rara repercussão. Ela é fator de progresso, pois o amigo autêntico aperfeiçoa e educa pela palavra e pelo exemplo; é penhor de segurança, uma vez que o amigo leal é remédio para todas as angústias, dado que a amizade é força espiritual. Entretanto, há condições para que floresça a amizade.

Pode-se dizer que são seus ingredientes: a sinceridade, a confiança, a disponibilidade, a tolerância, a compreensão e a fidelidade. Saint-Exupéry afirmou em sua obra "O Pequeno Príncipe": "És eternamente responsável por aquilo que cativas".

Na plenitude dos tempos Jesus apresentou-se como legítimo amigo. Ele declarou: "Já não vos chamo servos, mas amigos" (Jo 15,15) e havia dito: "Ninguém dá maior prova de amor do que aquele que entrega a vida pelos amigos" (Jo 15,13). Rodeou-se de pessoas, as quais se repletaram dos eflúvios de Sua bondade. Felizes os que O conheceram, como Lázaro, Marta, Maria, Seus amigos de Betânia; os Doze Apóstolos; Nicodemos; Zaqueu; Dimas, o bom ladrão; e tantos outros. É, porém, preciso levar a amizade a sério.

A Bíblia assegura que "O amigo fiel é medicina da vida e da imortalidade" (Eclo 6,16). Disse, porém, Santo Agostinho: "A suspeita é o veneno da amizade". Bem pensou, porque a amizade finda onde a desconfiança começa. O amigo é luz que guia, é âncora em mar revolto, é arrimo a toda hora. Esparge raios de sol de alegria, derramando torrentes de clarões divinos. Dulcifica o pesar. Tudo isso merece ser pensado e repensado. É essencial, todavia, meditar também sobre o ensinamento bíblico: "Quem teme a Deus terá bons amigos, porque estes serão semelhantes a Ele" (Eclo 6,17).

Cônego José Geraldo Vidigal de Carvalho*
*Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos

É o Espirito Santo que dá sentido a vida











Hoje celebramos a primeira noite do Triduo Paulino e embora, todos os anos o celebremos, sempre Deus nos toca de um modo novo, nos faz experimentá-lo de modo único e vai nos moldando conforme a Sua vontade.

Acredito ter sido esta a experiência pela qual passou Saulo de Tarso a Caminho de Damasco quando o Senhor foi ao seu encontro e logo depois, investi-lo de poder pela a imposição das mãos de seu servo Ananias. A força que tomou conta de seu ser foi tão profunda, que aquele homem, a quem todos conhecia como perseguidor dos cristãos, passou a ser também perseguido pelas causas do reino de Deus. "Paulo(nome que foi chamado após sua conversão) fazia tudo que o Senhor mandava", pois foi promessa de Jesus: “Este homem vai ser para mim um instrumento escolhido que levará o meu nome diante das nações, dos reis e dos filhos de Israel” e de cidade em cidade onde passou anunciando o Reino de Deus, o Espírito Santo o conduzia, advertia, corrigia e fazia, por meio dele, muitos milagres e sinais.


"São paulo foi um homem que se deixou ser guiado, usado pelo Espírito Santo"(Francisco)

Este mesmo Espírito é que também hoje deve ser o condutor de nossa caminhada discipular. O mesmo zelo de testemunhar o evangelho da graça de Deus precisa tomar conta de nosso ser, do nosso viver e guiar os nossos passos, pois, como afirma São Paulo, "fomos constituidos pelo Espirito Santo , a sermos guardiães da Igreja de Deus que ele adquiriu com o sangue do seu proprio Filho". É uma grande responsabilidade, mas não há outro modo para ser cristão de verdade, para ser feliz de verdade. Só quem conhece a Cristo pode viver essa perfeita alegria. vejamos o que nos disse o proprio Paulo cheio da unçao de Deus: Eu vivo, mas já não sou eu quem vive, é Cristo que vive em mim” (Gl 2,20).

Deixemos Deus ser Deus em nossas vidas e então haveremos de fazer milgares, prodígios e darmos testemunhos maiores ainda da graça que habita em nós.

Leila Lemos
Cons. do Apostolado da Bênção

O DISCIPULADO HOMENAGEIA SEU PATRONO, SÃO PAULO



Este mês celebramos com muita alegria o grande apóstolo e evangelizador São Paulo, Patrono e baluarte do Discipulado de Jesus Cristo.

NESTA ALEGRIA, TODOS OS DJCs LOCAIS CELEBRAM DE 28 A 30 O TRIDUO PAULINO COM MUITO Louvor,Oração, Pregação da Palavra de Deus, Devoção Mariana e Fraternidade com as barraquinhas de comidas tìpicas e apresentações e danças juninas.

Participe desta Festa em cad DJC Local!

Aprendamos um poico mais sobre a vida de SÃO PAULO.


Paulo, cujo nome na versão hebraica é Saulo, nasceu em Tarso, na Cilícia, hoje território da Turquia, entre os anos 7 e 10, segundo a grande maioria dos historiadores. Filho de pais judeus da diáspora estudou em escola grega e por isso tinha como língua materna este idioma. Mas também foi formado em doutrina judaica, em Jerusalém, onde passou parte de sua juventude, na famosa escola do Rabino Gamaliel. Assim seria fluente também na língua aramaica. Era fariseu, homem culto, de espírito empreendedor, de uma têmpera singular em tudo o que fazia.

Todos nós sabemos o quanto Saulo de Tarso perseguia tenazmente os cristãos. Mas Jesus o esperava no caminho de Damasco, porque queria fazer do perseguidor o Apóstolo das Nações.

Jesus, que apareceu para ele no caminho, poderia fazer tudo que tencionava. Mas não. Ele lhe dá uma ordem para que entre em Damasco, porque é lá que lhe deve ser dito o que deve fazer. Ao mesmo tempo, Cristo aparece a Ananias, um homem simples daquela cidade, cristão recentemente convertido, e o envia com ordens precisas para que vá a casa onde está Saulo, porque “este homem” – disse-lhe Jesus – “vai ser para mim um instrumento escolhido que levará o meu nome diante das nações, dos reis e dos filhos de Israel”. E acrescenta: “Eu lhe mostrarei tudo o que terá de padecer pelo meu nome”.

Ananias obedece. Vai até Saulo, impõe-lhe as mãos e este é curado da cegueira e fica cheio do Espírito Santo. Só depois disso é que ele [Saulo] é batizado, e no impulso e no poder do Espírito, que o possui, começa imediatamente a proclamar nas sinagogas que Jesus Cristo é o Filho de Deus. O que o antigo perseguidor recebe do Senhor, através da imposição das mãos e da oração de Ananias, é o que ele vai fazer agora em favor de todos aqueles a quem o Senhor o enviar.

A partir de Antioquia, para onde ele é convocado a ir por Barnabé, Paulo vai ser o grande apóstolo da efusão do Espírito e do uso dos carismas. Ele impõe as mãos sobre os pagãos e eles ficam cheios do Espírito Santo, convertem-se, são batizados e começam uma vida nova em Cristo.

Paulo se deixa usar pelos carismas do Espírito e, então, prodígios, sinais, curas, milagres se realizam diante dos novos convertidos. O apóstolo lhes demonstra que essa graça é também para eles. Assim, ele os exorta a impor as mãos e a pedir que muitos outros recebam o batismo no Espírito. Ele os impulsiona a se deixarem usar pelos carismas do Espírito Santo e igualmente maravilhas acontecem por meio deles.

Foi em Antioquia que o próprio Espírito Santo separa Paulo de Barnabé e os envia em missão. Foram três grandes viagens apostólicas que aconteceram e assim as principais cidades do mundo então conhecido são atingidas por essa explosão do poder do Espírito. Sempre guiado pelo Espírito, Paulo vai chegar a Roma, onde, apesar de estar em prisão domiciliar, exerce corajosamente um amplo trabalho missionário. É aí que no ano 67 ele culmina com o martírio a sua maravilhosa missão. Paulo foi realmente o Apóstolo das Nações.

São Paulo é considerado o primeiro teólogo do cristianismo, sendo seus textos, básicos para toda a teologia posterior. Foi o primeiro escritor da fé cristã, através de cartas que enviava às comunidades, a fim de ensinar, animar a fé, corrigir distorções doutrinais e reconduzir ao bom caminho os que moralmente hesitassem.

Desta forma cremos que esse é um tempo muito oportuno que o senhor dá a sua Igreja: conhecer São Paulo e descobrir a unidade extraordinária deste homem e da sua vida. Para ele, ser apóstolo é seguir Jesus Cristo, fazer-se discípulo de Jesus Cristo e participar na sua vida e no mistério de Jesus Cristo.

A seu exemplo queremos dar a nossa contribuição, assumindo nossa missão evangelizadora de levar Jesus Cristo e a sua Salvação ao nosso mundo paganizado testemunhando o nosso ser discípulos para formar tantos outros discípulos para Jesus.

Fonte: Canção Nova
Adaptação: Leila

A terrível realidade do “mais ou menos”



A indecisão esvazia as possibilidades, e a dúvida conduz a alma à tristeza

O homem pode libertar-se de tudo, menos de sua consciência, e não há nada que a incomoda mais que uma vida vivida no “mais ou menos”, ou melhor: uma vida mais ou menos vivida. Porque a indecisão esvazia as possibilidades, e a dúvida conduz a alma à tristeza.

Mais ou menos é a medida da derrota, é o selo do fracasso, é a marca de tudo o que poderia ter sido bem-feito, mas não foi vivido com intensidade. Há uma palavra no livro de Jeremias que diz: “Maldito aquele que faz com negligência a obra do Senhor” (Jr 48,10a). Quem negligencia não deixa de fazer, mas o faz com descuido, com desleixo, sem atenção; faz mais ou menos.

Um homem mais ou menos justo não é justo, uma mulher mais ou menos fiel não é fiel e um coração mais ou menos quente é morno. Coragem! Chega de deixar escapar as oportunidades que Deus lhe dá, por medo de se entregar! Por que deixar mais uma vez para amanhã aquilo que Deus quer para agora? Tudo o que foi postergado para o dia de amanhã deixou um vazio no hoje, que é o único tempo que você realmente tem. Mas não desanime por isso!

Deus é amor, Deus ilumina, Deus inspira, Deus acalma sua alma, Deus preenche o vazio que você traz dentro de seu coração. Ele lhe dá uma nova chance para lutar e, quando você cansar, Ele será o seu repouso... mas Ele precisa da matéria prima para construir a sua nova história. Ele precisa da sua luta. Essa mudança é possível porque a fé ainda remove montanhas, porque a oração ainda toca o céu e a persistência continua tornando realidade resultados aparentemente impossíveis de ser alcançados.

Márcio Mendes-CN

Voltar ao primitivo fervor



Esta é a graça que Deus quer que experimentemos, a graça da promessa que o Senhor antes de sua ascensão fez aos discípulos. O que Deus quer é que você alimente no coração a expectativa da promessa do Pai: "Recebereis o Espírito Santo e sereis minhas testemunhas". É esta força do alto que nós devemos esperar e desejar do mais profundo do nosso coração. Foi esta força do alto que o apóstolo Paulo experimentou e que nos relata em Atos dos Apóstolos no capítulo 9.

Paulo a caminho de Damasco, ao ouvir o Senhor falar, recebe a revelação de Deus que indica o caminho onde ele deveria ir, a casa onde ele ficaria hospedado e lá viver o processo que Jesus faria em seu coração. O sentimento que nós precisamos alimentar no nosso coração é o desejo do cumprimento da promessa de Deus. Paulo obedece porque foi conquistado por Jesus.

Jesus traz a revelação ao coração de Ananias, e ele sabia quem era Saulo. E Ananias respondeu: "Senhor, muitos já me falaram deste homem, quantos males fez aos teus fiéis em Jerusalém. E aqui ele tem poder dos príncipes dos sacerdotes para prender a todos aqueles que invocam o teu nome. Mas o Senhor lhe disse: Vai, porque este homem é para mim um instrumento escolhido, que levará o meu nome diante das nações, dos reis e dos filhos de Israel" (Atos 9,13-15).

Deus quer cumprir essa promessa “Sereis batizados no Espírito Santo”. Não frustre os planos de Deus na sua vida, porque Ele quer fazer de você um escolhido para ser cumprimento da promessa. Aqui está o grande segredo de Paulo, que mais tarde vai dizer: "Ai de mim se eu não evangelizar".

Deus se revelou a Paulo, a Ananias, ao povo de Éfeso, mas Deus trás esta revelação a nós. Você percebeu que a revelação diz de uma forma profética em Apocalipse? "Conheço tuas obras, teu trabalho e tua paciência: não podes suportar os maus, puseste à prova os que se dizem apóstolos e não o são e os achaste mentirosos. Tens perseverança, sofreste pelo meu nome e não desanimaste" (Apocalipse 2). Veja também o que Ele diz: "Mas tenho contra ti que arrefeceste o teu primeiro amor". Ele está falando da tua experiência inicial. Talvez por causa de uma mentalidade de que você agora é um homem maduro, participa da liderança na Igreja, e não tem mais aquele fervor do início. Porque isso é para os iniciantes, empolgados, que rezam fervorosamente, e você até diz que era até exagerado demais. Mas o Senhor está dizendo a nós: "não basta você ser bonzinho, perseverante, ter sofrido por causa do nome do Jesus, mas lembra de onde caíste e volta a radicalidade inicial, a vida de oração inicial e sai desta naturalização estéril".

O Senhor nos chama a continuar fiéis como Paulo, testemunhando carismaticamente com todos os dons. Não basta termos conhecimentos teológicos e filosóficos, precisamos buscar conhecimento sim, mais que isso, é preciso querer ser um doutor, mestre, PhD, um profissional cheio de Pentecostes.

Só uma pessoa cheia do Espírito Santo é capaz de evangelizar com fervor porque não deixou perder a experiência do primeiro amor. É tempo de voltar ao primeiro amor, não resista ao amor de Deus, Ele é louco de amor por você. Volte ao primeiro amor, experimente novamente a paixão por Jesus, se abra a essa ação do Espírito Santo, pois é isso que Deus quer que experimentemos.

Foi exatamente isso que Jesus fez com Pedro, pois Jesus sabia que Pedro estava frio, ele tinha se decepcionado consigo mesmo. E quem é que nunca se decepcionou consigo mesmo? Pedro estava tão decepcionado que voltou a pescar. A decepção nos faz voltar a pecados terríveis que já tínhamos nos libertado deles. Foi isso que Pedro experimentou, ele estava abalado, e o Senhor depois de comer com eles chama Pedro e pergunta: "Pedro tu me amas mais do que a estes?" Jesus perguntou porque queria reavivar o coração de Pedro e fazê-lo acreditar de novo de que ele era capaz.

Deus quer hoje reinflamar o seu coração de amor. Deus entende você, mas hoje Ele está lhe pedindo para que você abra o coração e volte ao primeiro amor. Ele te ama. Deixa Jesus conquistar você. Ele desce na condição em que você está para te amar. Jesus acredita em você.

Pe. Roger Luis

A amizade: uma fascinante virtude!



A filosofia tem nos ensinado que para os gregos a amizade (Philia) é o que existe de mais fascinante, depois da sabedoria (Sophia). Para eles, a sabedoria é o mesmo que virtude. O filósofo Cícero (106 a.C.–43 a.C.), no seu diálogo sobre a amizade (De Amicite), fala de maneira extraordinária da virtude na relação de amizade. Segundo o filósofo somente os virtuosos possuem amigos! É a virtude que promove e conserva a amizade, porque ela é responsável pela s provas do amor e pela capacidade das renúncias necessárias na relação.

Só pode haver verdadeira amizade naquele que se dispõe a morrer para si mesmo e dar-se ao outro. "Ninguém me tira a vida; eu a dou livremente" (Jo 10,18). Daí que a amizade requer um constante sair de si, lealdade e transparência, constância e justiça. Na amizade tudo deve ser verdadeiro. Assim, o maior ornamento da amizade vem a ser o respeito e a fidelidade aos segredos do amigo. Os amigos são guardiões do sacrário, que é o coração daqueles que amamos. Nula é a amizade em que não há verdade. O livro do Eclesiástico fala das conseqüências da falta de verdade e confiança entre os amigos (Cf. Eclo 27,16).

O que faz a amizade é a estabilidade entre os amigos, que é fruto da convivência construída na base dos valores sólidos do amor. Esta estabilidade é ainda sinõnimo da paz que provém do dar a vida pelo amigo (Cf. Jo 15,13). A virtude é a escada onde esse amor amadurece. Sem virtude não há amizade possível, mas apenas superficialidade, adulação, paixão e interesses egoístas. Entre as pessoas de bem há uma inevitável simpatia e condescendência. Entre os amigos existe sempre a liberdade de sentir-se amado, apoiado e acolhido quando os fardos da vida nos assolam o coração. Se não há a virtude a amizade empobrece e não vive a sua vocação à eternidade.

A amizade tem grande poder de sedução e de atração pela força da afeição entre as pessoas amigas. A afeição cria vínculos, mais que o parentesco. É a afeição que proporciona o bem-estar entre os amigos, a simpatia recíproca. É sedutora a troca de atenções e bons serviços. Sem amizade a vida não é amável. Na mais profunda amizade se encontra a mais profunda doçura. Sem afeição e simpatia, a vida não tem alegria, porque a afeição se traduz em benevolência, afabilidade, reciprocidade. Portanto, os componentes da amizade são a virtude, a afeição, a fidelidade e a disposição de servir os nossos amigos.

A amizade entre Jônata e David (Cf. I Samuel18,1.20) muito nos ensina sobre essa disposição para o serviço até mesmo em correr riscos pra fazer o amigo feliz. Quanto mais somos generosos, bondosos, desinteressados, amorosos, mais amizades conquistamos. Isso não significa sermos ingênuos e bobos. Mas pessoas livres, que amam com liberdade e maturidade, compreendendo que as pessoas não nos pertencem e devemos deixá-las livres para escolher o nosso amor. Sejamos os primeiros a darmos provas do nosso amor e dos nossos gestos de virtude. Eis um grande segredo para a conquista e o cultivo da amizade.

O amigo é como um outro de nós mesmos, uma versão exemplar de nós mesmos, disse o filósofo Aristóteles. Melhor interpretou Santo Agostinho ao dizer: "A amizade é como ter uma única alma em dois corpos" (Cf. Confissões). A amizade torna os duros golpes da vida mais leves e mais maravilhosos os favores da vida, porque podem ser comunicados e partilhados com alguém. A amizade dá otimismo para o futuro, não permite a capitulação nem a desmoralização. Retirar a amizade da vida é como retirar o sol do mundo. Nela encontramos satisfação, descanso, conselho, partilha. Nada expressa tão bem os momentos da vida, do que a amizade. Por isso deve ser preferida a todos os bens da terra, porque é prestativa, respeitosa e fiel. Na verdadeira amizade está um sinal forte daquele amor e relação que tem o Pai com Jesus, transbordando assim para com o homem.

Pela amizade os ausentes estão presentes no afeto, os indigentes são ricos, os fracos são cheios de força, os mortos estão vivos na lembrança. Sem amizade, nenhuma casa fica de pé, nenhuma cidade subsiste, a vida na terra é insuportável, porque ela é um sentimento de amor verdadeiro e espontâneo que ameniza o convívio. Sem amizade, a vida se esvazia. A amizade é uma fascinante virtude!

Também faz-se necessário lembrar que os amigos não são perfeitos e erram, até nos desapontam, desaparecem algumas vezes e reclamam nossa atenção, nosso cuidado. Muitas vezes sofremos com a insenssibilidade, mas não julguemos os nossos amigos os façamos uma cobrança egoísta do seu amor. Na amizade o diálogo e o perdão são segredos essenciais para o cultivo da confiança e da fidelidade. Uma amizade construída na convivência e como fruto de uma história de dores e algrias não pode acabar ou cair na indifrença por causa das limitações de um e de outro. Queiramos amar o amigo e o melhor é sempre darmos o primeiro passo, pois somente o amor ressuscita um relacionamento e recorda ao coração do amigo que a amizade é um compromisso para quem estar disposto a amar além das fraquezas.

Quem cultiva a amizade conhece os segredos para se viver no amor da Trindade, porque ela é um dom de Deus vivido na reciprocidade, portanto, é também dom escatológico. É Santíssima Trindade o modelo do amor que ama até o fim (Cf. Jo 13,1), pois ela é comunhão de perfeita amizade, o próprio amor (Cf I Jo 4,8). Como é bom dizer ao amigo que o amamos e fazê-lo sentir no coração e na alma o quanto estamos unidos, não obstante os desafios, as fraquezas, as diferenças e até mesmo os impedimentos para a convivência. O amor supera tudo isso e diz ao silêncio do seu coração cada novo dia: “És meu amigo! Amo você! Que fascínio!”.


Antonio Marcos- Com. Shalom

A amizade: uma fssc[ionante

Rios de Água Viva




No último dia, que é o principal dia de festa, estava Jesus de pé e clamava: “Se alguém tiver sede, venha a mim e beba. Quem crê em mim, como diz a Escritura: Do seu interior manarão rios de água viva”. Dizia isso, referindo-se ao Espírito que haviam de receber os que cressem nele, pois ainda não fora dado o Espírito, visto que Jesus ainda não tinha sido glorificado.

Não importa a situação que você esteja vivendo, tem jeito. E mais do que jeito, esse jeito tem nome e é de graça porque é a própria graça. De um extremo dos ossos secos, penso que nenhum de nós chegou ainda a esse extremo. O profeta Ezequiel olha um vale de ossos humanos jogados, e Deus pergunta ao profeta: “Tem jeito?”. “Profetiza sobre esses ossos filho do homem!” Imaginem essa cena, o profeta olhando para aquele monte de ossos e profetizando: “Vem Espírito santo sobre esses ossos”. E começa o filme de terror, primeiro os ossos foram se juntando, e os esqueletos foram sendo montados. Agora manda vir carne. E começa a grudar carne e ali estão um bando de cadáveres, parece alguns católicos que a gente conhece, não faz nada. Serve para alguma coisa ainda? Profetiza sobre esses cadáveres. E o profeta profetiza, e vem um sopro de Deus, eles começam a se levantar e formam um grande e maravilhoso exército. Essa é a esperança, essa é a certeza. Pode ser que a sua família esteja no osso, seja o que for, tem jeito. E esse jeito tem nome, é Espírito Santo de Deus. Tem saída!

E Jesus no Evangelho diz isso de uma forma fenomenal, na grande festa das luzes, a festa das tendas em Jerusalém. São João diz que o principal dia da festa, o mais solene, Jesus deu um berro, esse Deus continua gritando: “Quem tem sede, venha a mim e beba, quem crer em mim do seu interior jorrarão rios de água viva”. Dizia isso referindo-se ao Espírito Santo que ainda não tinha sido dado.

Todos nós temos essa sede, lá no fundo do nosso coração há essa sede de Deus, a humanidade inteira tem sede de Deus, e busca preencher essa sede com as águas barrentas que o mundo vende, mas no fundo é essa sede profunda, e nós vamos saciar essa sede no lugar errado, nos abastecemos de água morta, de água suja, de água contaminada. Você que tem sede, Jesus diz, venha! Que lado estou indo? Onde eu estou indo buscar? Se eu estou nessa situação, se eu estou no osso, onde eu estou indo buscar? Na Nova Era? Nas falsas religiões? Nessa religião que não me compromete? Nos astros, na astrologia? No ter, no poder no prazer? Onde estou indo buscar? E que água estou bebendo? Enquanto vamos bebendo e nos saciando com a água barrento do pecado, de dentro de nós vai fluindo um rio de águas mortas. E esse rio de águas mortas é o ódio, o desamor, a mentira, o pecado, é o que vai transformando essa vida num túmulo. A profecia diz que aqueles ossos representam cada um de nós, a raça de Israel, porque quando não deixamos nos conduzir no Espírito Santo de Deus, nós somos pior do que osso, não tem serventia nenhuma, vamos nos tornando pessoas sem vida, pessoas amarradas, sem ideais, fracas, que caem no primeiro obstáculo, fazem tempestade em copo d’água, e as vezes o copo nem está cheio. Onde estamos indo saciar essa sede? Se não for do coração desse Senhor que nos ama não vai jorrar em nós esse rio de água viva.

Esses três versículos de São João mostram a dinâmica do Espírito, e é por isso que em Atos dos Apóstolos São Lucas fala do Espírito como força do alto, como dínamos. E o que é dínamos? Me lembro, quando eu era moleque, lá no Biguá, não tinha luz elétrica. Mas lá em casa descia um córrego, e tinha uma represa que papai fez de cimento. Quando soltava a represa a água caía num tubo e chegava no motor, onde tem o dínamos, e gerava luz elétrica.

Dínamos é aquela máquina que transforma a energia mecânica da água em eletricidade. E é essa a idéia que nós temos desses três versículos de São João. “Aquele que crê em mim bebe”. Não é qualquer um que bebe, para beber essa água viva tem que crer em Jesus. “Quem tem sede vem a mim, e beba quem crê em mim”, “e quem crer e beber, do seu interior…”. Do interior de quem? De quem bebeu. “jorrarão rios de água viva”. O Espírito é essa força do alto, porque ele entra em nós como a água que entra na turbina, no dínamos e faz ele girar, e ele vai girando a uma velocidade incrível, e vai gerando eletricidade. Ele faz a vida, ele pega a força da água, pois o Espírito Santo quer produzir em nós esses rios de água viva. E que rios de águas vivas são esses? É facílimo de descobrir. Sabe como você sabe se uma pessoa é de fato batizado no Espírito Santo ou não? Olha o rio que sai do interior dela. O que jorra do interior dessa pessoa? Seu marido é batizado no Espírito Santo? Porque ele reza em línguas? Isso aí basta rezar um pouco enrolado e quem não sabe pensa que é línguas.

Quando eu estive no Egito eu pensava que eles rezavam em línguas o tempo todo. Como é que eu sei se alguém é batizado no Espírito Santo? Se do interior dele jorram rios de água viva. E que rios são esses? São Paulo em Gálatas 5 faz um lista: Aquele que deixa-se conduzir pelo Espírito produz os frutos do Espírito: amor, alegria, paz, bondade, docilidade, temperança, mansidão, fidelidade, firmeza, castidade, persistência. Mas embora aquele que diz que é um homem ou mulher de Deus, mas que não se deixa conduzir pelo Espírito Santo, ele produz frutos… E o Papa João Paulo II na Encíclica: “O Espírito Santo, O Senhor que dá a vida… Aquele que acolhe o Espírito, esse produz os frutos do Espírito, e aquele que resiste ao Espírito produz os frutos da resistência ao Espírito”. Os frutos da resistência ao Espírito formam uma lista medonha: desamor, mentira, ódio, impureza, fofoca, calúnia… Que frutos nós estamos produzindo? Mas não o que eu digo, porque uma árvore não conhecemos pela casca, mas sim pelos frutos. Que frutos as pessoas que convivem comigo percebem em mim. “Ah Padre, mas eu sou uma pessoa fraca.” Louvado seja Deus se você chegou a essa conclusão. Porque segundo São Paulo essa é a única condição para você beber dessa fonte de água viva. O Espírito Santo só pode vir em auxílio da nossa fraqueza. Você é fraco? Então você pode ser cheio do Espírito Santo.

Pe.Léo
Comunidade Bethânia

Amar de verdade



Não é tão fácil amar de verdade. Isto exige entrega total, serviço e doação. Foi o mandamento novo deixado por Jesus Cristo quando ele disse: “amai-vos uns aos outros, como eu vos amei”. Fazei isto, mesmo num mundo que endeusa muito os princípios do individualismo.

Quem ama respeita a dignidade do outro, não discrimina e nem marginaliza ninguém. Luta para que todos tenham vida e as condições para se viver bem. Evita agir com autoritarismo que subordina os mais despidos e com egoísmo individualista.

Continuamos com o tempo da Páscoa. O norte a seguir é a fidelidade ao projeto de Deus, de ação carregada com atitudes de amor, de compromisso, de simplicidade e determinação. É uma entrega de vida de forma livre, mas comprometida com a causa.

O autêntico amor tem sentido de “ágape”, isto é, vivido gratuitamente. Ele deve permear a vida de quem vive a Páscoa como tempo de compromisso na convivência. Por aí passa o sentido do testemunho cristão, que atrai e eleva a vida das pessoas.

O amor deve encorajar a vida de todos que procuram ser bem intencionados. Isto faz com que eles valorizem o bem que o outro realiza, soma forças e evita dificultar o caminho dos que conseguem avançar. Ele faz a pessoa passar por cima de muitas tribulações e angústias.

Não é fácil enfrentar conflitos, contra-testemunhos e desgastes na vida. Mas é importante o processo histórico de purificação. Quando assumido com coragem, os frutos serão de alegria e de firmeza na caminhada. O fundamental é não se abater.

Toda voz que anuncia a verdade, incomoda. Foi o que sucedeu com Cristo. Hoje acontece o mesmo, porque o projeto de Deus é exigente, na contramão de uma cultura pouco preocupada com a partilha e a vida com dignidade para todos.

Amar é uma entrega para construir uma humanidade saudável, dando a vida para a construção do Reino de Deus. Aí está o termômetro e o sinal indicativos do seguimento e de fidelidade ao projeto de Jesus Cristo.

Dom Paulo Mendes Peixoto
Bispo de São José do Rio Preto.

As testemunhas



O Antigo Testamento bíblico foi um tempo de profecia e de preparação para a chegada dos objetivos do Reino de Deus. Hoje a comunidade cristã tem por obrigação testemunhar e concretizar o projeto iniciado por Jesus Cristo.

Assim sendo, a Igreja precisa estar sempre em estado de missão, colocando em prática os indicativos da Palavra de Deus, não perdendo de vista a necessidade incondicional da presença e da atuação viva de Jesus ressuscitado.

A realidade social, a violência e a exclusão generalizada ocasionam desânimo e um clima de cansaço. Com isto perdemos o rumo do nosso caminho, mergulhamo-nos na escuridão e numa vida de atividade quase sem sentido.

Por outro lado, não podemos perder a sensibilidade da presença de Cristo ressuscitado e de seu Espírito norteador. É como uma pesca sem resultado à primeira vista, mas rendosa a partir do seguimento da Palavra orientadora de Jesus Cristo.

Quanto mais desanimados, tristes, frustrados e sem perspectivas, menos frutos colhemos de nossas atividades. A fartura é fruto da confiança e de objetivos claros de forma total, gratuita e entusiasmada. O amor tem que ser uma ação até as últimas consequências.

Dar testemunho de Jesus Cristo pode levar ao sofrimento, ao mesmo caminho percorrido por Ele. Alguns são até torturados e mortos, são eliminados porque foram corajosos e determinados. A omissão impede o cumprimento dos objetivos concretos do Reino.

A sociedade capitalista neoliberal e consumista de hoje nos faz viver na escuridão, sem contar com a luz de Cristo ressuscitado que nos pede amor incondicional. O fio condutor do cristão é Jesus Cristo.

Os desafios para o testemunho hoje são muito grandes. Ele deve ser partilhado na comunidade cristã. A insensibilidade nos impede de enxergar Jesus, porque Ele está presente em nosso meio, particularmente nos gestos de fraternidade e partilha.

A fecundidade e a vida de comunidade dependem de obediência aos ensinamentos de Jesus Cristo. Isto Cria entusiasmo e alegria no serviço aos irmãos, superando uma fé morna demais, fazendo renascer o profetismo em nosso tempo.

Dom Paulo Mendes Peixoto
Bispo de São José do Rio Preto.

A era moderna e a alma serena



Não é pecado aproveitar as maravilhas do mundo moderno

Vivemos tempos de grandes 'milagres' modernos. Nunca o mundo viu tamanha velocidade de informação. Nunca se viu possibilidades técnicas tão avançadas como agora. Qualquer coisa que aconteça do outro lado do mundo é conhecido, quase ao mesmo tempo, pelo planeta todo. Basta um 'clique' com o mouse do computador para enviar a centenas de destinatários informações sobre guerras, atentados, tsunamis ou mortes.

O mundo vive seu apogeu científico: pesquisadores ousam romper o limite do ético e do biológico manuseando células-tronco e redescobrindo as nuances do código genético humano. Nunca como agora foi tão fácil conhecer culturas e pessoas geograficamente distantes e virtualmente presentes. É fácil para empresas virtuais arranjarem até 'casamentos' por encomenda! Somando as características de cada pretendente e calculando num software online a maior probabilidade de 'combinação' conjugal. Ultimamente ouve-se falar até de robôs tecnologicamente treinados para manifestar emoções.

Em contrapartida, nunca se viu um mundo tão caótico. Hoje, com um simples botão pode-se acender uma lâmpada em casa ou iniciar uma detonação atômica capaz de deflagrar a 3ª Guerra Mundial. O apelo da multidão chega a causar medo, fobias… é mais seguro e prazeroso perder horas navegando na Internet. No mundo virtual: uma coleção de amigos de Orkut, popularidade garantida! No mundo real: uma coleção de dias em solidão à frente de um computador. Nunca como agora se ouviu falar tanto de depressão, suicídio, perda do sentido da vida e apelo ao uso de drogas para driblar o tédio da modernidade.

Não é pecado aproveitar as maravilhas do mundo moderno. Deus não condena ninguém que tente, cientificamente, salvar vidas respeitando-as totalmente. Não há nada de errado em enriquecer-se conhecendo culturas e estreitando laços, virtuais ou não. O que, de fato, é contraditório é trocar o real pelo imaginário. É tolice trocar um abraço, enxugar uma lágrima de saudade por um "emoticon" do MSN. Com uma mensagem de celular posso escrever “eu te amo”, mas nada substitui a companhia fiel da pessoa amada nas horas difíceis da vida, de mãos dadas, lado a lado até que a morte os separe.

Por mais que a Era Pós-moderna nos maravilhe com suas descobertas, o homem continua sempre o mesmo: criado para amar e ser amado. Agostinho, santo católico que nasceu na África, convertido pelas lágrimas orantes de sua santa mãe, depois de 30 anos de libertinagem e boemia escreveu: “Senhor, tu nos fizeste e somos teus! E inquieto estará nosso coração enquanto não repousar em ti!” Ele tinha razão! Toda nossa curiosidade pela modernidade acaba sufocada pela sede interior que não quer calar…

Maravilhemo-nos com aquilo que a modernidade nos dá. Todavia, não nos esqueçamos de que as coisas da alma não se resolvem com um 'clique' ou um 'enter' de computador. É preciso algo mais. Alguém maior: Deus! Ele é o mesmo, ontem, hoje e sempre (cf. Heb 13,8)! Sempre moderno!

Padre Delton
Com. Canção Nova

Quer ser feliz?



Decida-se não parar diante das situações frustrantes

O ser humano constantemente busca a felicidade. Tudo o que as pessoas empreendem e visam tem como meta encontrar uma realização. Desde os gestos mais simples, como suprir as necessidades básicas, até os mais audaciosos projetos, são impulsionados pelo desejo de satisfação interior.

Essa procura pelo preenchimento da alma está inscrita no coração do homem. Deus nos fez para sermos felizes.

O Catecismo da Igreja Católica afirma: "Somente em Deus o homem há de encontrar a verdade e a felicidade que não cessa de procurar" (CIC 27). É no Senhor que descobrimos a feliz vivência e a verdade acerca de todas as coisas, inclusive a nosso próprio respeito.

Em vários trechos da Sua Palavra, o Altíssimo nos dá princípios e ordens que nos orientam como proceder para sermos contagiados pelo bem-estar que vem d'Ele: "A alegria do Senhor será a vossa força" (Ne 8, 10); O Sermão da Montanha (Mt 5, 1-11); Honra teu pai e tua mãe para que sejas feliz e tenhas vida longa sobre a terra (Ef 6,2); e muitos outros.

Só desencaminha-se de tal desígnio divino aquele que procura ser feliz fora de Deus, que busca a sua própria verdade e realização (como se assim pudesse existir), motivado por uma noção inexata de como alcançar a felicidade. Em vez de construir uma Alegria incorruptível, procura gozo imediato sem projetar as consequências posteriores.

É essa a tentação que foi oferecida a Jesus no deserto (cf. Mt 4; Lc 4) e que também hoje o demônio usa para nos seduzir. Ele quer arrancar-nos a identidade através das ilusões do Ser, do Ter e do Poder, assim, cedemos aos impulsos que trarão satisfação apenas momentaneamente, colocamo-nos no lugar de deuses, perdemos a consciência da verdade a nosso respeito e consequentemente idolatramos aquilo que nos dá prazer.

Para vivermos a felicidade, desde já, é preciso renunciar a essas três tentações (ser, ter poder), trabalhando em nós virtudes que são inversas a elas, as quais nos restabelecem a verdade de sermos criaturas e de que somente em Deus obteremos a alegria.

São práticas contrárias às tentações:

O Louvor: palavras de agradecimento, de exaltação ao Senhor, que O colocam em primeiro plano na nossa vida, rendendo adoração Àquele que é e tudo pode em nós, por nós e em meio a nós. Louvar tira do ser humano a tentação do ser, pois só Deus é.

Mesmo em meio à tribulação louve, pois “todas as coisas concorrem para o bem daqueles que amam Deus” (Rm 8,28). Só um coração agradecido confia verdadeiramente nisso, pois louva a Deus diante de sua impotência e conta com o Deus Misericórdia, acreditando que mesmo do sofrimento algo de proveito virá.

Amaldiçoar nessa hora é não acreditar que o Senhor manifestará seu socorro.

Outro fator, é que aquele que não murmura, torna-se mais agradável no convívio com outras pessoas. Causam boa impressão onde passam. “A boca fala daquilo de que o coração está cheio” (Lc 6,45).

A Gratuidade: faça coisas sem esperar retribuição. Muitas das decepções que temos na vida vêm por esperarmos demais dos outros. Gratuidade liberta nosso coração de apegos e méritos, livra-nos da obrigação de recompensas, inclusive de nossas cobranças com nós mesmos. Quem não cobra do irmão, aprende a valorizar a pessoa em primeiro lugar a partir da experiência consigo.

Tenha iniciativa você, quando o outro não merece é sinal de que precisa ainda mais.

Agir com gratuidade é confiar na Divina Providência, já que proporciona o dom que se obteve de Deus em favor de quem está ao lado: “Recebestes de graça, de graça dai!” (Mt 10,8) e subtrai do coração a inclinação de ter.

O amor só é pleno quando é com gratuidade: “não é interesseiro, desculpa tudo, crê tudo, espera tudo, suporta tudo” (I Cor 13, 5-6).

A Decisão: Aja para que sua felicidade aconteça. Tenha metas a pequeno, médio e longo prazo. A felicidade vem por meio de um projeto de vida. Se hoje não deu certo, não desista! Deus está nos seus sonhos. Sonhos podem ser o indicativo do Pai para a sua vocação.

Decida-se não parar diante das situações frustrantes. Isso comporta uma predisposição do coração em não se prostrar mediante os percalços e imprevistos do dia a dia. É natural ficar pesaroso diante de algo que venha a ferir os sentimentos, mas não se deve arrastar o problema ou supervalorizá-lo. O sofrimento tem que ser fecundo. Aprendemos com a dor. Mas tudo nesta vida passa! Nada permanece, a não ser Deus.

Lembre-se de que a pessoa que decide viver bem o seu dia, não se abate com alguns minutos que não foram favoráveis.

Decidir pela felicidade em Deus, investe contra o anseio de poder, pois busca motivos interiores para ser feliz e não se sujeita a estar bem por conquistar bens ou por ter pessoas subordinadas. É errônea a concepção de que só se é feliz quando se conquista algo.

Por fim, é possível não somente chegar à alegria terrena, na nossa natureza humana, como também ao júbilo espiritual, pois a felicidade é um dom para o ser humano no seu todo.

O Pai quer realizar-nos por completo, dando-nos a identidade de sermos filhos, que junto a Ele têm a posse do Seu Reino e de um dia podermos dividir da Sua glória. Aí está a verdade da felicidade.

Sandro Ap. Arquejada
Missionário Canção Nova

Fonte: Site Canção Nova

A lição do Domingo de Ramos



Cristo faz sua entrada solene em Jerusalém, recebendo uma aclamação jamais vista na História. Surge então a grande questão: como é que Jesus sendo Deus e, portanto, sabendo que iria ser crucificado e objeto de escárnio daquele mesmo povo permitiu aquela consagração? Ele via por detrás dos braços que no ar o aplaudiam o fulgurar das espadas e o levantar de punhos cerrados a clamarem pela sua crucifixão.

Qual a razão pela qual Ele permitiu todo aquele alvoroço, toda aquela festa? Na resposta a grande lição deste Dia de Ramos. É que Ele queria ensinar que devemos sempre desconfiar dos louvores humanos . Ele desejava mostrar qual o verdadeiro valor do triunfo terreno. Ele almejava alertar seus seguidores sobre qual a autêntica conquista que deveriam buscar, oferecia uma autêntica filosofia de vida a seus epígonos.

É inato ao ser humano o anseio pela gratidão, pelo reconhecimento, pela glória. Isto, afastado o vão orgulho, a vaidade simplória, a detestável arrogância, a antipática petulância, não é, em si, um mal.. Com efeito, tais aspirações projetam a conquistas grandiosas que fazem os sábios, os heróis dos altares pátrios, os cientistas famosos, os gênios extraordinários que, olhos fixos na consagração de seus contemporâneos e pósteros pontilham o mundo com seus feitos memoráveis.

Os triunfos terrenos, porém, são ilusórios. São sombras que passam, névoa que os lábios da inveja logo dissipam, nuvens que se desfazem, seta luminosa que fende os ares e logo se apaga, meteoro que logo desaparece, flor que breve se emurchece. São passageiros e logo são olvidados, lançados no esquecimento.

O mesmo sol que os contempla pela manhã os vê fenecer à tarde. Os homens são sempre os mesmos: mudam-se rapidamente seus sentimentos, suas apreciações, suas atitudes e hosanas se transforma em clamores de morte, como aconteceu com Jesus. Eis aí a grande lição do dia de hoje.

Na terra misturam-se o bem com o mal, o encômio com a injúria, a ventura com o desar, a alegria com a tristeza, a aclamação com o ultraje, o elogio com a calúnia. A rainha das flores, a rosa, é bem o símbolo desta realidade. Os espinhos circundam a beleza desta flor como que patenteando a vida humana. Então, como não há nesta vida rosa sem espinho, nem pérola sem limo ou prata sem liga, nem sol sem sombras, nem céu sem nuvens, nem peixes sem espinhas assim não há glória terrena sem o travo das afrontas ou da invídia. O triunfo humano conhece sempre o fel da humana inveja.

Isto acontece com rapidez impressionante, pois se no decorrer do ano há inverno e verão e entre eles muitos meses; dia e noite e entre eles vinte e quatro horas, para existirem o elogio e o desprezo, hosanas e clamores de morte, loas e injúrias basta um instante.

É para esta inequívoca precariedade das vitórias, das glórias, das honras humanas que neste dia nos chama a atenção o Mestre divino. Ramos não assinalou Sua vitória verdadeira. Seu triunfo Ele o conheceria em outra manhã radiosa, no momento de sua gloriosa ressurreição.

Aqueles mesmos que o aclamaram hoje o levarão ao suplício da cruz. Cumpre então ter na devida conta os louvores. Tenhamos um conceito preciso dos bens terrenos. Almejemos não as frágeis e perecíveis conquistas nesta terra, mas sim a felicidade perene da Jerusalém celeste onde Cristo vitorioso está a nossa espera. Lá, sim, se encontram os louros que não emurchecem nunca e não são jamais atingidos pela traça destruidora da humana inveja.

Este anelo da apoteose da glória eterna, das alegrias perenes, do júbilo nos deslumbrantes palácios do Rei imortal dos séculos, nos projetará na posse de glória imperecível. Será este o dia do nosso grande triunfo que não terá ocaso pois estaremos por todo sempre juntos ao Redentor vitorioso.


Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho
Shalom.org

Fonte: A Voz do Solencio

Como vai a sua autoestima?



Cada um de nós possui representações mentais internas das pessoas mais importantes em nossa vida, inclusive de nós mesmos. A autorrepresentação, ou autoimagem, pode ser coerente ou distorcida. Além disso, nós trazemos uma imagem mental do que gostaríamos de ser ou do que pensamos que deveríamos ser; é o ideal de ego.

A autoestima é o resultado da correspondência entre a nossa autoimagem e o nosso ideal de ego. Quanto mais achamos que estamos próximos do jeito que gostaríamos de ser, tanto mais teremos a autoestima equilibrada; de forma contrária, quanto mais estivermos frustrados com os nossos próprios objetivos e aspirações, tanto mais a nossa autoestima estará baixa.

A nossa autoimagem exerce uma grande influência em nossa vida, em nosso desempenho profissional e em nosso relacionamento interpessoal. O que pensamos a nosso respeito, a nossa autoimagem ou senso de autovalorização, influencia cada parte de nossa vida.

Aqueles que têm um bom e saudável senso de autovalorização se sentem importantes, acreditam que têm valor e irradiam esperança, alegria e confiança. Ao contrário, uma autoimagem inadequada nos tira a energia e o poder de atenção, necessários para bem nos relacionarmos com os outros; e um bom relacionamento interpessoal é fundamental em tudo o que fazemos. Nosso senso de inadequação nos impossibilita amar e dar atenção aos outros, pois nos leva a nos sentir rejeitados e incompreendidos; temos medo do que possam pensar de nós, não nos sentimos bem em grupos e não nos aceitamos como somos.

Ter uma autoimagem inadequada faz com que nos preocupemos com as opiniões, elogios ou críticas dos outros, como fatores determinantes para a nossa vida. Um senso de autovalorização muito baixo nos torna escravos da opinião dos outros e nos impede de sermos nós mesmos.

Por isso, quero convidar você para fazer um exercício neste momento e olhar para a sua imagem mental: O que você vê em si mesmo? Você está satisfeito com o que vê? Qual a visão que você tem de si mesmo quando se compara com outras pessoas?

Anote cinco pontos fortes e cinco fracos que você observa em si mesmo.

Em qual lista que você levou mais tempo para fazer as anotações? Na dos pontos fortes ou dos fracos?

Precisamos aprender a nos ver como Deus nos vê, a descobrir quem somos, a assumir o nosso valor, que vem do fato de sermos imagem e semelhança de Deus, filhos de Deus, filhos amados de Deus.

São Paulo, na sua Carta aos Romanos (Rm 12,3), nos ensina: “Pela graça que me foi dada, recomendo a cada um de vós: ninguém faça de si uma ideia muito elevada, mas tenha de si uma justa estima, de acordo com o bom senso e conforme a medida da fé que Deus deu a cada um”.

A nossa autoestima precisa ser equilibrada: nem alta, nem baixa, para que saibamos lidar com os nossos limites e fracassos, e para que tenhamos relacionamentos sadios e uma autoimagem correta, sem depreciações nem elevações. Por isso, uma autoestima equilibrada é fundamental para todos nós, filhos de Deus, para que possamos evangelizar, para que sejamos alegres e felizes em toda e qualquer circunstância.
O que fazer então para termos uma autoestima e uma autoimagem positiva e equilibrada?

Comece trabalhando a sua autovalorização, dando-se conta de que você é uma pessoa criada por Deus, imagem e semelhança de Deus, com limites e com qualidades. Você precisa entender que o seu valor não está no que você faz ou tem, está em você, no seu ser pessoa, com tudo o que você é, seu temperamento, seus dons e talentos.

Procure identificar quais são as suas qualidades e não só os seus limites. Aprender a lidar com os nossos limites, entender que ninguém é perfeito, que todos nós temos limitações e qualidades, é fundamental para uma autoestima e uma autoimagem equilibrada. Aprenda a não se cobrar tanto, e a não cobrar do outro também. Aprenda a se aceitar como você é. Nesse processo, aprender com as experiências vividas, com os erros e fracassos é fundamental. De tudo o que vivemos, precisamos tirar um lado positivo, uma aprendizagem, assim, nada passa em vão, tudo tem o seu devido proveito.

Atividades físicas, fazer coisas simples no seu cotidiano que você gosta, ter um tempinho para cuidar de si mesmo, do seu corpo e de sua saúde, também favorecem a autoestima.

Concluindo: para se ter uma autoestima equilibrada o mais importante é termos uma correta autovalorização, sabendo lidar com os nossos limites e fracassos. Como há um bom caminho pela frente a seguir, para trabalharmos em nós mesmos, coloquemo-nos a caminho. O colocar-se a caminho já é uma atitude que faz crescer a autoestima e, aos poucos, dia após dia, num processo que, às vezes, é lento, mas que precisa ser contínuo, vamos atingindo a justa estima de nós mesmos.

Manuela Melo
Missionária da Comunidade Canção Nova, formada em Psicologia, com especialização em Logoterapia e MBA em Gestão de Recursos Humanos.

Cristo Oferece a si mesmo a Deus



1. A novidade do sacerdócio de Cristo

Nesta meditação, queremos refletir sobre o sacerdote como administrador dos mistérios de Deus, entendendo desta vez por “mistérios” os sinais concretos da graça, os sacramentos. Como não podemos nos deter em todos os sacramentos, nos limitaremos ao sacramento por excelência que é a Eucaristia. Assim procede também a Presbyterorum Ordinis, que, após falar dos presbíteros como evangelizadores, prossegue dizendo que seu serviço, “que começa pela pregação evangélica, tira do sacrifício de Cristo a sua força e a sua virtude”, misticamente renovado por estes ao altar [1].

Estas duas atribuições do sacerdote são aquelas que também os apóstolos reservam a si mesmos: “Quanto a nós – declara Pedro em Atos –, continuaremos a nos dedicar à oração e ao ministério da Palavra” (At 6,4). A oração da qual fala não é a oração privada; é a oração litúrgica comunitária que tem como centro o partir o pão. A Didaché nos permite perceber como a Eucaristia, nos primeiros tempos, era oferecida no próprio contexto da oração da comunidade, como parte desta e seu cume [2].

Como o sacrifício da Missa não pode ser concebido a não ser em dependência com o sacrifício da cruz, da mesma forma o sacerdócio cristão não pode ser explicado a não ser em dependência e como participação sacramental no sacerdócio de Cristo. É daqui que devemos partir para descobrir a característica fundamental e os requisitos do sacerdócio ministerial.

A novidade do sacrifício de Cristo em relação ao sacerdócio da antiga aliança (e, como já sabemos, em relação a qualquer outra instituição sacerdotal também fora da Bíblia) é posta em relevo na Carta aos Hebreus por diversos pontos de vista: Cristo não precisa, como os sumos sacerdotes, oferecer sacrifícios a cada dia, primeiro por seus próprios pecados e depois pelos do povo. Ele já o fez uma vez por todas, oferecendo-se a si mesmo (7,27); não necessita repetir uma vez mais o sacrifício, mas “na plenitude dos tempos, uma vez por todas, ele se manifestou para destruir o pecado pela imolação de si mesmo” (9, 26). Mas a diferença fundamental é outra. Vejamos como é descrita:

“Cristo, porém, veio como sumo sacerdote dos bens futuros. Ele entrou no Santuário através de uma tenda maior e mais perfeita, não feita por mãos humanas, nem pertencendo a esta criação. Ele entrou no Santuário, não com o sangue de bodes e bezerros, mas com seu próprio sangue, e isto, uma vez por todas, obtendo uma redenção eterna. De fato, se o sangue de bodes e touros e a cinza de novilhas espalhada sobre os seres impuros os santificam, realizando a pureza ritual dos corpos, quanto mais o sangue de Cristo purificará a nossa consciência das obras mortas, para servirmos ao Deus vivo!” (Hb 9, 11-14).

Enquanto qualquer outro sacerdote oferece algo externo a si, Cristo oferece a si mesmo; qualquer outro sacerdote oferece vítimas, mas Cristo oferece a si mesmo como vítima! Santo Agostinho sintetizou em uma célebre fórmula esse novo gênero de sacerdócio, no qual o sacerdote e a vítima são um só: Ideo victor, quia victima, et ideo sacerdos, quia sacrificium: “vencedor por ser vítima, sacerdote por ser vítima” [3].

Na passagem dos sacrifícios antigos para o sacrifício de Cristo, observa-se a mesma novidade notada na passagem da lei à graça, do dever ao dom, ilustrada na meditação anterior. De uma obra do homem para aplacar a divindade e reconciliá-la consigo, o sacríficio passa a ser dom de Deus para aplacar o homem, fezê-lo desistir de sua violência e reconciliá-lo por meio dele (cf. Col 1,20). Também no que diz respeito ao seu sacríficio, como em tudo mais, Cristo é “totalmente outro”.

2. “Imitem aquilo que executam”

A consequência de tudo isso é clara: para ser sacerdote “segundo a ordem de Jesus Cristo”, o presbítero deve, como ele, oferecer a si mesmo. Sobre o altar, portanto, ele não representa tão somente o Jesus “sumo sacerdote”, mas também o Jesus “suma vítima”, sendo assim as duas coisas inseparáveis. Em outras palavras, não se pode contentar em oferecer Cristo ao Pai nos sinais sacramentais do pão e do vinho; deve também oferecer a si mesmo com Cristo ao Pai. Retomando um pensamento de Santo Agostinho, a instrução da S. Congregação dos Ritos, Eucharisticum mysterium, escreve: “A Igreja, esposa e ministra de Cristo, cumprindo com ele a função de sacerdote e vítima, oferece-o ao Pai, e, junto a Ele, oferece-se a si mesma” [4].

O que se afirma aqui a respeito da Igreja como um todo aplica-se de um modo todo especial ao celebrante. No momento da ordenação, o bispo dirige aos ordenados a seguinte exortação: Agnoscite quod agitis, imitamini quod tractatis: “Tenham em conta aquilo que farão, imitem o que celebrarão”. Em outras palavras: faça também você aquilo que faz Cristo na Missa, isto é, ofereça-se a si mesmo a Deus como sacrifício vivo. Escreve são Gregório Nazianzeno:

“Sabendo que ninguém é digno da grandeza de Deus, da Vítima e do Sacerdote, se não se é primeiramente oferecido a si mesmo em sacrifício vivo e santo, se não se é apresentado como oblação santa e agradável (cf Rom 12, 1) e se não se tiver oferecido a Deus um sacrifício elogiável e um espírito contrito – o único sacríficio que o autor de todos os dons nos pede – como ousaria oferecer-lhe uma oferenda exterior sobre o altar, que é a representação dos grandes mistérios?”

Permito-me contar como eu mesmo descobri essa dimensão de meu sacerdócio, porque possa talvez nos ajudar a compreender melhor o assunto que estamos tratando. Após minha ordenação, eis como vivi o momento da consagração: fechei os olhos, abaixei a cabeça e busquei me isolar de tudo o que estava ao meu redor, para assim me ligar a Jesus, que, no cenáculo, pronunciou pela primeira vez as palavras: “Accipite et manducate…”, “Tomai e comei...”.

A própria liturgia favorecia esta atitude, ao fazer pronunciar as palavras da consagração em voz baixa e em latim, voltado para o altar e não para o povo. Mais tarde, um dia, compreendi que tal atitude, por si só, não expressava todo o significado de minha participação na consagração. Quem preside de forma invisível toda Missa é Jesus ressuscitado e vivo, o Jesus, para sermos exatos, que esteve morto, mas que agora vive para sempre (cf. Ap 1, 18). Mas este Jesus é o “Cristo total”, Cabeça e corpo indissociavelmente unidos. Assim, se é este Cristo total quem pronuncia as palavras da consagração, também eu as pronuncio com ele. Dentro do grande “Eu” da Cabeça, esconde-se o pequeno “eu” do corpo que é a Igreja e também e meu “eu” pequenino.

Desde então, quando, como sacerdote ordenado da Igreja, pronuncio as palavras da consagração “in persona Christi”, acreditando que, graças ao Espírito Santo, estas têm o poder de transformar o pão no corpo de Cristo e o vinho em seu sangue, ao mesmo tempo, como membro do corpo de Cristo, já não fecho mais os olhos, mas olho para os irmãos que estão diante de mim, ou, se celebro sozinho, penso naqueles a quem devo servir ao longo do dia e, voltado para eles, digo mentalmente, junto a Jesus: “Irmãos e irmãs, tomai e comei: este é meu corpo; tomai e bebei, este é meu sangue”.

Em seguida, encontrei uma singular confirmação nos escritos da venerável Concepciòn Cabrera de Armida, dita Conchita, a mística mexicana fundadora de três ordens religiosas e cujo processo de beatificação está em curso. A seu filho jesuíta, que estava prestes a ser ordenado sacerdote, ela escrevia: “Lembre-se, meu filho, que quando tiver em mãos a Hóstia Santa, não dirá: Eis o corpo de Cristo, eis o seu sangue, mas dirá: Este é meu corpo, este é meu sangue: deve operar-se em ti uma transformação total, deves perder-te nele, ser um outro Jesus” [6].

A oferenda do sacerdote e de toda a Igreja, sem aquela de Jesus, não seria nem santa, nem agradável a Deus, porque somos criaturas pecadoras; mas a oferenda de Jesus, sem aquela de seu corpo que é a Igreja, seria também incompleta e insuficiente: não, evidentemente, por termos alcançado a salvação, mas porque a recebemos e dela nos apropriamos. É nesse sentido que a Igreja pode dizer com São Paulo: “completo, na minha carne, o que falta às tribulações de Cristo” (cf. Col 1, 24).

Podemos ilustrar com um exemplo o que ocorre em toda Missa. Imaginemos que em uma família ocorre que um dos filho, o primogênito, é muito afeiçoado ao pai. Por ocasião de seu aniversário, decide dar-lhe um presente. Porém, antes de apresentá-lo, pede, em segredo, a todos os irmãos e irmãs que assinem também o presente. Este chega então às mãos do pai como uma homenagem por parte de todos os seus filhos e como um símbolo do amor de todos eles, mas, na verdade, apenas um deles pagou pelo valor do presente.

Jesus admira e ama ilimitadamente o Pai celeste. A ele quer oferecer, todos os dias até o fim do mundo, o presente mais precioso que se poderia conceber: sua própria vida. Na Missa, convida a todos os seus “irmãos”, que somos nós, a também assinarem o presente, “o meu e o vosso sacrifício”, como diz o sacerdote no Orate fratres. Mas, na verdade, sabemos que apenas um pagou pelo preço de tal presente. E que preço!

3. O corpo e o sangue


Para entender as consequências práticas para o sacerdote que derivam de tudo isso, é necessário ter em mente o significado da palavra “corpo” e da palavra “sangue”. Na linguagem bíblica, a palavra corpo, assim como a palavra carne, não indica, como seria para nós hoje, uma terceira parte da pessoa como na tricotomia grega (corpo, alma, nous); indica a pessoa em sua totalidade, enquanto esta vive em uma dimensão corpórea. (“O Verbo se fez carne” significa se fez homem, não ossos, músculos, nervos!). Por sua vez, “sangue” não significa uma parte de uma parte do homem. O sangue é a fonte da vida, de modo que a efusão do sangue é um símbolo da morte.

Com a palavra “corpo”, Jesus nos doou sua vida; com a palavra sangue, nos doou sua morte. Aplicado a nós, oferecer o corpo significa oferecer o tempo, os recursos físicos, mentais, um sorriso, típico de um espírito que vive em um corpo; oferecer o sangue é oferecer a morte. Não apenas o momento final da vida, mas tudo aquilo que desde já antecipa a morte: as mortificações, as doenças, a passividade, tudo o que é negativo na vida.

Tentemos imaginar a vida sacerdotal vivida com esta consciência. Toda o dia, não apenas o momento da celebração, é uma eucaristia: ensinar, governar, confessar, visitar os doentes, bem como o repouso e o lazer, tudo. Um professor espiritual, o jesuíta francês Pierre Olivant, dizia: “Le matin, moi prêtre, Lui victime; le long du jour Lui prêtre, moi victime: a manhã (naquele tempo a missa era celebrada somente de manhã), eu sacerdote, Ele (Cristo) vítima; ao longo do dia, Ele sacerdote, eu vítima. “Como faz bem um padre – dizia o Santo Cura dA’rs – em oferecer-se a Deus em sacrifício todas as manhãs” [7].

Graças à Eucaristia, também a vida do sacerdote idoso, doente e reduzido à imobilidade é preciosíssima para a Igreja. Este oferece “o sangue”.

Visitei certa vez um sacerdote que estava doente de câncer. Estava a se preparar para celebrar uma de suas últimas Missas, com a ajuda de um jovem sacerdote. Tinha também uma doença nos olhos, que fazia com que estivesse sempre em lágrimas. Me disse: “Jamais havia compreendido a importância de falar também em meu nome na Missa: “Tomai e comei; tomai e bebei...”. Hoje compreendo. É tudo o que me resta, e digo isto pensando em meus paroquianos. Compreendi o significado de ser “um pão partido” pelos outros.

4. A serviço do sacerdócio universal dos fiéis


Uma vez descoberta esta dimensão existencial da Eucaristia, é tarefa pastoral do sacerdote contribuir para que seja vivenciada também pelo restante do povo de Deus. O ano sacerdotal não representa uma oportunidade e uma graça somente para os padres, mas também para os leigos. A Presbyterorum ordinis afirma claramente que o sacerdócio ministerial está a serviço do sacerdócio universal de todos os batizados, a fim de que estes “possam oferecer-se a si mesmos como hóstia viva, santa e aceitável por Deus (Rm 12,1). De fato:

“É através do ministério dos presbíteros que o sacrifício espiritual dos fiéis é tornado perfeito por união ao sacrifício de Cristo, único mediador; este sacrifício, de fato, pela mão dos presbíteros e em nome de toda a Igreja, é oferecido na eucaristia de modo sacramental sem derramamento de sangue, até o dia da vinda do Senhor” [8].

A constituição Lumen gentium do Vaticano II, falando do “sacerdócio comum” de todos os fiéis, escreve: “os fiéis, por sua parte, concorrem para a oblação da Eucaristia... pela participação no sacrifício eucarístico de Cristo, fonte e centro de toda a vida cristã, oferecem a Deus a vítima divina e a si mesmos juntamente com ela ; assim, quer pela oblação quer pela sagrada comunhão, não indiscriminadamente mas cada um a seu modo, todos tomam parte na ação litúrgica.”

A Eucaristia é, portanto, ato de todo o povo de Deus, não apenas no sentido passivo, mas também ativamente, no sentido de que é realizada mediante a participação de todos. O fundamento bíblico mais claro desta doutrina é Romanos 12, 1: “Eu vos exorto, irmãos, pela misericórdia de Deus, a vos oferecerdes em sacrifício vivo, santo e agradável a Deus: este é o vosso verdadeiro culto”.

Comentando estas palavras de Paulo, São Pedro Crisólogo dizia: “o Apóstolo vê assim elevados todos os homens à dignidade sacerdotal, para oferecerem os próprios corpos como sacrifício vivo. Oh, imensa dignidade do sacerdócio cristão! O homem foi tornado vítima e sacerdote por si mesmo. Não busca mais fora de si algo a ser imolado a Deus, mas traz em si mesmo aquilo que sacrifica a Deus... Irmãos, este sacríficio é inspirado naquele de Cristo” [10].

Examinemos como o modo de viver a consagração que ilustrei pode ajudar também os leigos a unirem-se à oferenda do sacerdote. Também o leigo é chamado, como vimos, a oferecer-se a Cristo na Missa. Pode fazê-lo usando as mesmas palavras de Cristo: “Tomai e comei, este é meu corpo”? A meu ver, não há nada que se oponha a isso. Não fazemos o mesmo quando, para expressar nossa submissão à vontade de Deus, recorremos às palavras ditas por Jesus na cruz: “Pai, em tuas mãos entrego meu espírito”; ou quando, em momentos de provação, repetimos: “Afasta de mim este cálice”, ou qualquer outra palavra do Salvador? Usar as palavras de Jesus nos ajuda nos unirmos aos seus sentimentos.

A mística mexicana que mencionei anteriormente sentia dirigidas também a ela, e não apenas a seu filho sacerdote, as palavras de Cristo: “Desejo que, transformado pelo sofrimento, pelo amor e pela prática de todas as virtudes, erga-se aos céus este grito de tua alma em união com Cristo: este é meu corpo, este é meu sangue” [11].

O fiel leigo deve apenas estar consciente de que estas palavras, por ele proferidas na Missa, não têm o poder de fazer presentes o corpo e o sangue de Cristo sobre o altar. Ele não age, neste momento, in persona Christi; não representa Cristo, como faz o sacerdote ordenado, mas apenas se une a Cristo. Por isso, não deve dizer as palavras da consagração em voz alta, como o sacerdote, mas no próprio coração.
Imaginemos o que ocorreria caso também os leigos, no momento da consagração, dissessem silenciosamente: “Tomai e comei: este é meu corpo. Tomai e bebei: este é meu sangue”. Uma mãe de família celebra assim sua Missa, e depois retorna a casa para dedicar-se aos seus milhares de pequenos afazeres. Sua vida está literalmente esmigalhada; aparentemente, não deixará qualquer marca na história. Mas o que faz, definitivamente, não é algo a ser desprezado: uma eucaristia junto a Jesus! Uma freira diz, também ela, em seu coração, no momento da consagração: “Tomai e comei...”; em seguida, vai se dedicar ao seu trabalho cotidiano: crianças, doentes, idosos. A Eucaristia “invade” seu dia, que se torna então uma extensão da Eucaristia.

Mas gostaria de me deter em particular em duas categorias de pessoas: os trabalhadores e os jovens. O pão eucarístico, “fruto da terra e do trabalho do homem”, há de ter algo importante a dizer a respeito do trabalho humano – e não apenas o do agricultor. No processo que parte do grão semeado e culmina com o pão sobre a mesa, intervém a indústria com seu maquinário, o comércio, os transportes e uma infinidade de outras atividades - enfim, todo o trabalho humano. Ensinemos o trabalhador cristão a oferecer, na Missa, seu corpo e seu sangue, isto é, seu tempo, seu suor, sua fadiga. Assim, o trabalho não será mais, como na ótica marxista, algo alienante, cujo fim se restringe ao produto que está sendo vendido; passa a ser santificante.

E que dizer aos jovens sobre a Eucaristia? Basta que tenhamos uma coisa em mente: o que deseja o mundo dos jovens hoje? O corpo, nada mais que o corpo! O corpo, na mentalidade do mundo, é essencialmente um instrumento de prazer e desfrute. Algo a ser vendido, espremido enquanto ainda é jovem e atraente, para depois ser descartado, juntamente com a pessoa, quando já não serve mais a estes propósitos. Especialmente o corpo da mulher se tornou um artigo de consumo.

Ensinemos os jovens cristãos a dizerem, no momento da consagração: “Tomai e comei, este é meu corpo, que será entregue por vós”. O corpo, assim, passa a ser consagrado, torna-se algo sagrado, que já não pode mais ser entregue ao consumo, que já não pode ser vendido, uma vez que é uma oferenda. Tornou-se eucaristia com Cristo. O apóstolo Paulo escrevia aos primeiros cristãos: “O corpo, porém, não é para a prostituição, ele é para o Senhor... Então, glorificai a Deus no vosso corpo (1 Cor 6, 13.20). E explicava em seguida as duas formas de glorificar a Deus com o próprio corpo: ou com o matrimônio, ou com a virgindade, de acordo com a vocação de cada um (cf. 1 Cor 7, 1 ss.).

5. Com a obra do Espírito Santo

Onde encontrar a força, sacerdotes e leigos, para fazer essa oferenda total de si mesmo a Deus, para erguer-se da terra com as próprias mãos? A resposta é: o Espírito Santo! Cristo, como vimos na primeira Carta aos Hebreus, ofereceu-se a si mesmo ao Pai em sacrifício, “no Espírito eterno” (Eb 9, 14), isto é, graças ao Espírito Santo. Foi o Espírito Santo que, assim como suscitou no homem o impulso para a oração, suscitou nele o impulso e o desejo de oferecer-se ao Pai em sacrifício pela humanidade.

O Papa Leão XIII, em sua encíclica sobre o Espírito Santo, diz que “Cristo cumpriu toda a sua obra, e, especialmente, seu sacrifício, com a intervenção do Espírito Santo (praesente Spiritu)” [12] e na Missa, antes da comunhão, o sacerdote ora dizendo: “Senhor Jesus Cristo, Filho do Deus vivo, que por vontade do Pai e com a obra do Espírito Santo (cooperante Spiritu Sancto), morrendo deu a vida ao mundo...”. Isto explica por que na Missa há duas “epicleses”, isto é, duas invocações do Espírito Santo: uma, antes da consagração, sobre o pão e o vinho; e outra, após a consagração, sobre a totalidade do corpo místico.

Com as palavras de uma destas epicleses (Oração eucarística III), peçamos ao Pai o dom de seu Espírito para que sejamos, em cada Missa, como Jesus, sacerdotes e, ao mesmo tempo, sacrifício: “Que Ele (o Espírito Santo) faça de nós um sacrifício perene e agradável a vós, para que possamos entrar no reino prometido com os eleitos: com a Virgem Maria, Mãe de Deus, com os santos e apóstolos, os gloriosos mártires e como todos os santos nossos intercessores junto a vós”.

Frei Raniero Cantalamessa

[Tradução de Paulo Marcelo Silva]

Quaresma - Experimentar a Misericórdia Divina



«Bem-aventurados os misericordiosos, porque eles alcançarão misericórdia»

A misericórdia de Cristo

«Bem-aventurados os misericordiosos, porque eles alcançarão misericórdia». Partindo, como sempre, da afirmação de que as bem-aventuranças são o auto-retrato de Cristo, também desta vez nos propomos imediatamente a pergunta: como Jesus viveu a misericórdia? O que a sua vida nos diz sobre esta bem-aventurança?

Na Bíblia, a palavra misericórdia se apresenta com dois significados fundamentais: o primeiro indica a atitude da parte mais forte (na aliança, Deus mesmo) para com a parte mais fraca e se expressa habitualmente no perdão das infidelidades e das culpas; o segundo indica a atitude para com a necessidade do outro e se expressa nas chamadas obras de misericórdia. (Neste segundo sentido, o termo se repete com freqüência no livro de Tobias). Existe, por assim dizer, uma misericórdia do coração e uma misericórdia das mãos.

Na vida de Jesus resplandecem as duas formas. Ele reflete a misericórdia de Deus para com os pecadores, mas se comove também ante todos os sofrimentos e necessidades humanas, intervém para dar de comer à multidão, curar os enfermos, libertar os oprimidos. Dele o evangelista diz: «Tomou sobre si nossas fraquezas e carregou nossas enfermidades» (Mt 8, 17).

Em nossa bem-aventurança, o sentido que prevalece é certamente o primeiro, o do perdão e da remissão dos pecados. Nós o deduzimos pela correspondência entre a bem-aventurança e sua recompensa: «Bem-aventurados os misericordiosos, porque eles alcançarão misericórdia», entende-se que é ante Deus, que perdoará seus pecados. A frase: «Sede misericordiosos como vosso Pai é misericordioso», se explica imediatamente com «perdoai e sereis perdoados» (Lc 6, 36-37).

É conhecida a acolhida que Jesus reserva aos pecadores no Evangelho e a oposição que isso lhe causou por parte dos defensores da lei, que o acusavam de ser «um comilão e beberrão, amigo de publicanos e pecadores» (Lc 7, 34). Uma das falas historicamente melhor testemunhadas de Jesus é: «Não vim para chamar os justos, mas os pecadores» (Mc 2, 17). Sentindo-se por Ele acolhidos e não julgados, os pecadores o escutavam com agrado.

Um Deus que se alegra em ter misericórdia

Jesus justifica sua conduta para com os pecadores dizendo que assim atua o Pai celestial. A seus detratores recorda a palavra de Deus nos profetas: «Misericórdia quero, e não sacrifícios» (Mt 9, 13). A misericórdia para com a infidelidade do povo, a hesed, é o traço mais sobressalente do Deus da Aliança e enche a Bíblia de um extremo a outro.

Um salmo o repete em forma de ladainha, explicando com ela todos os eventos da história de Israel: «Porque eterna é sua misericórdia» (Sal 136). Ser misericordiosos se apresenta assim como um aspecto essencial do ser «à imagem e semelhança de Deus». «Sede misericordiosos como vosso Pai é misericordioso» (Lc 6, 36) é uma paráfrase do famoso: «Sede santos, porque eu, o Senhor vosso Deus, sou santo» (Lv 19, 2).

Mas o mais surpreendente acerca da misericórdia de Deus, é que Ele experimenta alegria em ter misericórdia. Jesus conclui a parábola da ovelha perdida dizendo: «Haverá mais alegria no céu por um só pecador que se converta que por noventa e nove justos que não tenham necessidade de conversão» (Lc 15, 7). A mulher que encontrou o dracma perdido grita a suas amigas: «Alegrai-vos comigo». Na parábola do filho pródigo, também a alegria transborda e se converte em festa, banquete.

Não se trata de um tema isolado, mas profundamente enraizado na Bíblia. Em Ezequiel, Deus diz: «Eu não me alegro na morte do malvado, mas (me alegro!) em que o malvado se converta de sua conduta e viva» (Ez 33, 11). Miquéias diz que Deus «se alegra em ter misericórdia» (Mi 7, 18), isto é, experimenta gozo ao fazê-lo.

Mas por que - surge a questão - uma ovelha deve contar, na balança, como todas as demais juntas, e importar mais, precisamente porque escapou e criou mais problemas? Eu encontrei uma explicação convincente no poeta Charles Péguy. Aquela ovelha - como o filho menor -, ao extraviar-se, fez o coração de Deus tremer. Deus temeu perdê-la para sempre, ver-se obrigado a condená-la e privar-se dela eternamente. Este medo fez brotar a esperança em Deus, e a esperança, uma vez realizada, provocou a alegria e a festa. «Toda penitência do homem é a coroação de uma esperança de Deus» (Ch. Péguy, Il portico del mistero Della seconda virtù). É uma linguagem figurada, como tudo que falamos de Deus, mas contém uma verdade. Nos homens, a condição que torna a esperança possível é o fato de que não conhecemos o futuro, e por isso o esperamos. Em Deus, que conhece o futuro, a condição é que não quer (e, em certo sentido, não pode) realizar o que deseja sem nossa permissão. A liberdade humana explica a existência da esperança em Deus.

O que dizer então das noventa e nove ovelhas bem comportadas e do filho maior? Não existe nenhuma alegria no céu por eles? Vale a pena viver toda a vida como bons cristãos? Recordemos o que responde o Pai ao filho maior: «Filho, tu sempre estás comigo e tudo o que é meu é teu» (Lc 15, 31). O erro do filho maior está em considerar que ter ficado sempre em casa e ter compartilhado tudo com o Pai não é um privilégio imenso, mas um mérito; ele se comporta como mercenário, mais que como filho (isso deveria ser uma alerta para todos nós, que, por estado de vida, nos encontramos na mesma situação que o filho maior!).

Sobre este ponto, a realidade foi melhor que a própria parábola. Na verdade, o filho mais velho - o Primogênito do Pai, o Verbo -, não ficou na casa paterna; Ele partiu para «uma região distante» para buscar o filho menor, isto é, a humanidade caída; foi Ele quem lhe reconduziu a casa, quem lhe procurou vestes e lhe preparou um banquete para participar, em cada Eucaristia.

Em uma novela sua, Dostoievski descreve uma cena que tem todo o ambiente de uma imagem real. Uma mulher do povo tem em seus braços a sua criança de poucas semanas, quando esta - pela primeira vez, diz ela - lhe sorri. Compungida, ela faz o sinal da cruz e a quem lhe pergunta o por que desse gesto, ela responde: «Assim como uma mãe é feliz quando nota o primeiro sorriso de seu filho, assim se alegra Deus cada vez que um pecador se ajoelha e lhe dirige uma oração com todo o coração» (F. Dostoevskij, L'Idiota).

Nossa misericórdia, causa ou efeito da misericórdia de Deus?


Jesus diz «Bem-aventurados os misericordiosos, porque eles alcançarão misericórdia»; e no Pai Nosso nos faz rezar: «Perdoai as nossas ofensas, assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido». Diz também: «Se não perdoais os homens, tampouco vosso Pai perdoará vossas ofensas» (Mt 6, 5). Estas frases poderiam levar a pensar que a misericórdia de Deus para conosco é um efeito de nossa misericórdia para com os outros, e que é proporcional a ela.

Se assim fosse, no entanto, estaria completamente invertida a relação entre graça e boas obras, e se destruiria o caráter de pura gratuidade da misericórdia divina solenemente proclamado por Deus ante Moisés: «Realizarei graça a quem quiser fazer graça e terei misericórdia de quem quiser ter misericórdia» (Ex 33, 19).

Devemos, então, ter misericórdia porque recebemos misericórdia, não para receber misericórdia; mas é preciso ter misericórdia, senão a misericórdia de Deus não terá efeito em nós e nos será retirada, como o senhor da parábola a retirou ao servo impiedoso. A graça «previne» sempre e é ela a que cria o dever: «Como o Senhor vos perdoou, perdoai-vos também vós», escreve São Paulo aos Colossenses (Col 3, 13).

Experimentar a misericórdia divina

Se a misericórdia divina está no início de tudo e é ela a que exige e torna possível a misericórdia de uns para com os outros, então o mais importante para nós é ter uma experiência renovada da misericórdia de Deus. Nós estamos nos aproximando da Páscoa e esta é a experiência pascal por excelência.

O escritor Franz Kafka tem uma novela titulada «O Processo». Nela, fala de um homem que um dia, sem que ninguém saiba por que, é declarado em detenção, ainda que continue com sua vida costumeira e seu trabalho de modesto empregado. Começa uma extenuante busca para conhecer os motivos, o tribunal, as imputações, os procedimentos. Mas ninguém sabe dizer-lhe nada; só que existe verdadeiramente um processo contra ele. Até que um dia chegam para levá-lo à execução da sentença. No curso do sucesso se vai conhecendo que haveria, para este homem, três possibilidades: a absolvição autêntica, a absolvição aparente e a prorrogação. A absolvição aparente e a prorrogação, contudo não resolveriam nada; serviriam só para manter o imputado em uma incerteza mortal por toda a vida. Na absolvição autêntica, ao contrário, «as atas processuais devem ser completamente suprimidas, desaparecem totalmente do processo, não só a acusação, mas também o processo e até a sentença se destroem, tudo é destruído». Mas destas absolvições autênticas, tão suspiradas, não se sabe da existência de nenhuma; há só rumores ao respeito, nada mais que «belíssimas lendas». A obra conclui assim como todas as do autor: algo que se entrevê de longe, se persegue com afã como um pesadelo noturno, mas sem possibilidade alguma de alcançá-lo.

Na Páscoa, a liturgia da Igreja nos transmite a incrível notícia de que a absolvição autêntica existe para o homem, não é só uma lenda, algo belíssimo, mas inalcançável. Jesus destruiu «a acusação que havia contra nós; e a suprimiu pregando-a na cruz» (Col 2, 14). Destruiu tudo. «Nenhuma condenação pesa já para os que estão em Cristo Jesus» (Rm 8, 1). Nenhuma condenação! De nenhum tipo! Para os que crêem em Cristo Jesus!

Em Jerusalém havia uma piscina milagrosa e o primeiro que se jogava dentro, quando as águas se agitavam, ficava curado (v. Jo 5, 2 ss). No entanto a realidade, também aqui, é infinitamente maior que o símbolo. Da cruz de Cristo brotou a fonte de água e sangue, e não um só, mas todos os que se ajoelham dentro saem curados.

Depois do batismo, esta piscina milagrosa é o sacramento da Reconciliação, e esta última meditação desejaria servir precisamente como preparação para uma boa confissão pascal. Uma confissão «fora de série», ou seja, diferente das acostumadas, na qual permitamos de verdade ao Paráclito «convencer-nos do pecado». Poderíamos tomar como espelho as bem-aventuranças meditadas na Quaresma, começando agora e repetindo juntos a expressão tão antiga e tão bela:

Kyrie eleison! Senhor, tende piedade de nós!

«Bem-aventurados os puros de coração»: Senhor, reconheço toda a impureza e a hipocrisia que há em meu coração, talvez, a dupla vida que levo ante Vós e ante os outros. Kyrie eleison!

«Bem-aventurados os mansos»: Senhor, eu vos peço perdão pela impaciência e pela violência oculta que existe dentro de mim, pelos juízos temerários, o sofrimento que provoquei às pessoas a meu redor... Kyrie eleison!

«Bem-aventurados os que têm fome»: Senhor, perdoai minha indiferença para com os pobres e os famintos, minha contínua busca de comodidade, meu estilo de vida aburguesado... Kyrie eleison!

«Bem-aventurados os misericordiosos»: Senhor, freqüentemente pedi e recebi rapidamente a vossa misericórdia, sem dar-me conta do preço que ela vos custou! Com freqüência fui o servo perdoado que não sabe perdoar. Kyrie eleison!

Há uma graça especial quando não é só o indivíduo, mas toda a comunidade a que se põe ante Deus nesta atitude penitencial. De uma experiência profunda da misericórdia de Deus se sai renovados e cheios de esperança: «Deus, rico de misericórdia, pelo grande amor com que nos amou, estando nós mortos por causa de nossos delitos, nos vivificou juntamente com Cristo» (Ef 2, 4-5).

Procuremos identificar, em nossas relações com os outros, aquela que pareça mais necessitada de receber o óleo da misericórdia e da reconciliação, e a invoquemos silenciosamente, com abundância, pela Páscoa. Unamo-nos a nossos irmãos ortodoxos, que na Páscoa não se cansam de cantar:

«É o dia da Ressurreição!
Irradiamos gozo pela festa,
Abracemo-nos todos.
Digamos irmão também a quem nos odeia,
Perdoemos tudo por amor à Ressurreição»


Frei Raniero Cantalamessa
Cantalamessa.org

Deus não quer o mal, mas se o permite é por um bem maior, diz Papa



"Diante do pecado, Deus se revela misericordioso e não cessa de chamar de novo os pecadores a evitar o mal e a crescer em seu amor"

No Angelus deste domingo, 7, o Papa Bento XVI convidou os fiéis presentes na praça São Pedro, no Vaticano, a refletirem sobre os sofrimentos que acontecem em nossas vidas, e explicou que não trata-se de uma punição divina. "As desventuras, os acontecimentos funestos não devem ser para nós motivo de curiosidade ou de busca dos culpados, mas sim uma ocasião para refletir, para vencer a ilusão de poder viver sem Deus e para reforçar, com a ajuda do Senhor, nosso empenho em mudar de vida”, disse.

Refletindo sobre a liturgia deste domingo, o Papa destaca que, “perante a apressada conclusão de considerar o mal como efeito da punição divina, Jesus restitui a verdadeira imagem de Deus que é bom e não pode querer o mal, advertindo sobre a tendência a pensar que as desgraças são o efeito imediato de culpas daqueles a quem acontecem”.

“Diante de sofrimentos e de lutos, a autêntica sabedoria é deixar-se interpelar pela precariedade da existência e ler a história humana com os olhos de Deus, o qual, querendo sempre e exclusivamente o bem de seus filhos – por um desígnio insondável do seu amor – certas vezes permite que sejam provados pela dor, para conduzi-los a um bem maior”.

O Papa assegurou aos fiéis que “diante do pecado, Deus se revela misericordioso e não cessa de chamar de novo os pecadores a evitarem o mal, a crescerem em seu amor e a ajudarem concretamente o pobre desamparado, para viver a alegria da graça e não ir ao encontro da morte eterna. Mas a possibilidade de conversão exige que aprendamos a ler os fatos da vida na perspectiva da fé, isto é, animados pelo santo temor de Deus"

Como todos os domingos, o Papa fez saudações em várias línguas. Em português, disse: “Saúdo cordialmente a todos os peregrinos de língua portuguesa, de modo particular aos fiéis paroquianos de Santo António de Nova Oeiras, no Patriarcado de Lisboa, desejando que esta vinda a Roma vos confirme na fé e na necessidade de a transmitir aos outros, porque é dando a fé que ela se fortalece. A Santíssima Virgem guie maternalmente os vossos passos. Acompanho estes votos, com a minha Bênção Apostólica”.

Em francês, Bento XVI expressou seu pesar pela morte e a destruição causadas pela passagem da tempestade Xynthia na costa atlântica da França, que nos últimos dias, provocou 53 vítimas.

Enfim, o Papa desejou a todos um ‘bom domingo’, e concedeu aos presentes, ouvintes e telespectadores a sua benção apostólica

Por Canção Nova